quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Tindersticks - Curtains (1997)

Ao chegarem ao terceiro álbum, os Tindersticks apresentariam o seu mais bem polido registo que alguma vez haviam feito... No primeiro disco espalharam as pistas e diversas direcções por onde esta banda indie poderia seguir para o seu futuro. Ao segundo registo, escolheram focar-se só nalgumas dessas direcções e fizeram um disco maravilhoso, com nervo, daqueles que ficam tatuados. Ao terceiro, bem... depuraram ainda mais o som único que detinham. Sublimaram tudo o que bem sabiam fazer de maneira quase épica. Não se resignaram em meramente o fazer, eles apresentaram num nível elevadíssimo, até mesmo para eles.
Na altura, em 1997, as mais importantes publicações dedicadas à critica musical não se evitaram de enaltecer efusivamente esta nova obra da banda. Algumas disseram assim:


"Q" (Absolutely tremendous.);
"Uncut" (The greatest record on earth. Their music lifts up my soul.);
"New Musical Express" (Tindersticks have never been better.)...

Digo igualmente que sim, pois "Curtains" afigurou-se um álbum verdadeiramente marcante, megalómano, pomposo, orquestrado, sedutor, viciante... mas também exibe intenção, quando nos anteriores registos havia espontaneidade. De certa forma, para fazerem um grandioso disco, elaborado e tão pensado assim, todo o processo igualmente criou um enorme problema para a saúde da banda. Problemas esses que se deram ao longo do desenvolvimento e depois de sair para o mercado. Internamente, a banda sentiu-se obrigada a ter de dar uma boa resposta ao enorme sucesso que certos temas do segundo álbum obtiveram (do calibre de "Tiny Tears", por exemplo), e que eram recebidos em apoteose nos concertos. A banda superou a árdua tarefa com um disco superlativo... mas isso criou estragos internos, que viriam a conduzir a desistências e desentendimentos entre os membros. Depois de "Curtains" os Tindersticks nunca mais foram os mesmos e nunca mais repetiram a exímia fórmula exibida em 1997. Valeu-nos, aos fãs, a grande capacidade de reinvenção que a banda sempre desfilou e também ao grande Stuart Staples ao leme...
Destaco deste álbum as faixas: 
"Another Night In", "Rented Rooms", "Ballad Of Tindersticks", "Buried Bones" o dueto com Ann Magnuson, "Bathtime" e por fim, as duas belíssimas seguintes faixas que podem ser escutadas "Don't Look Down" e a "Let's Pretend" (talvez a melhor canção de sempre da banda).


Tindersticks - Tindersticks 1 (1993)

O homónimo longa-duração de estreia dos Tindersticks, foi um marco no rock indie... É um disco cru quando quer, é delicado quando precisa, é deslumbrante quando querem seduzir, é profundo quando quer deixar marcas... e instala em quem o souber apreciar, a vontade de se encontrar com este som de novo.
Os Tindersticks, antes da estreia deste primeiro álbum, já haviam lançado singles, tendo sido "Kathleen" (a primeira canção deles), o que despertou os mais atentos. 
Antes de terem este nome também se chamaram os Asphalt Ribbons.
Distinguiam-se por uma sonoridade rock, marcadamente indie, melancólica, cantada ao mais puro estilo crooner, mantendo as influências do rock de recorte mais clássico.
Muito criativos e multi-instrumentistas, pois recorreram desde sempre aos mais variados instrumentos, desde os xilofones, pianos, violinos, incluindo pequenas orquestras com cordas e sopros, sempre em sintonia com os instrumentos convencionais de uma banda rock. Eram estas as coordenadas que a banda apontava, apesar de se perceber que exploravam sem saber na realidade que rumo avançar. Tantas eram as possibilidades que apresentavam, que rapidamente se tornaram num grande sucesso underground.
"Tindersticks (1)", é daqueles discos que requer a dedicação de quem o ouve para ele se abrir verdadeiramente. Tanto abordam o rock ao estilo velvetiano com voz à Lou Reed, como sugerem saber fazer uma boa torch song, ou mais ainda uma incursão mariachi e algumas experiências sonoras interessantes.

Destaco deste 1º registo faixas memoráveis como: 
"Nectar", "Blood", "City Sickness" (das melhores de sempre, até hoje), "Marbles" (excelência, magnifica e soa a puro Velvet Underground), "Jism", "Her" e muito especialmente outro ponto alto de todo o disco que é a "Raindrops" (que muito me faz lembrar um valsa...).

"Raindrops"
Curiosidade: inicialmente esta canção teve o título de "The Big Silence"...

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Vinicius de Moraes (1913-1980)

Vinicius de Moraes nasceu no Rio de Janeiro, no dia 19 de Outubro de 1913. Foi aquele poeta que qualquer cantor queria ter por perto. O poetinha, que também foi diplomata, jornalista e dramaturgo, transpirava poesia. Era impossível não ficar rendido aos seus sonetos, à sua eterna arte de seduzir e conquistar através da palavra.
A vida boémia e de excessos que levou durante cinco décadas não permitiu tê-lo entre o reino dos vivos mais de sessenta e seis anos, mas a genialidade dos seus textos deram-lhe um visto gold para a eternidade, através das belíssimas canções que nasceram da sua caneta.
Sem surpresa, Vinicius cantou o Amor. De uma maneira intensa e persuasiva, bela e provocante, a que ninguém ficava indiferente. Foi ele o criador da imortal “Garota Ipanema” que desarma qualquer um no primeiro verso “Olha que coisa mais linda” e termina de modo sublime “Ah, se ela soubesse/ Que quando ela passa/ O mundo inteirinho se enche de graça/ E fica mais belo/ Por causa do amor”.
Vinicius eram um excelente parceiro. Além da eterna parceria com o uísque, formou nove parcerias conjugais dando razão a uma das suas mais célebres frases – “O Amor é eterno enquanto dura” -, mas aquelas que ficaram mais célebres foram as que assinou com Toquinho, Tom Jobim, João Gilberto, Chico Buarque, Carlos Lyra.
Há várias canções escritas por Vinicius que revisito, de quando em vez, no entanto há duas que aprecio pela sua qualidade poética, simplicidade e pelo impacto que tiveram na carreira do poetinha e de outros nomes grandes da cultura brasileira: “Chega de Saudade” e “Eu sei que vou te amar”. São dois saborosos frutos da parceria com o amigo Tom Jobim, nos maravilhosos anos cinquenta, da música popular brasileira.
No poema “Chega de saudade”, Vinicius declara a saudade como uma coisa triste e causador de sofrimento. Ele que sempre foi um prático, achou que as saudades eram coisa para morrer entre “abraços apertados, beijos e carinhos”. Curiosamente há outro texto do poetinha em que ele reconhece todas as agruras e sofrimentos do Amor. Em “Tempo de Amor”, Vinícius declara:

”Ah, bem melhor seria
Poder viver em paz
Sem ter que sofrer
Sem ter que chorar
Sem ter que querer
Sem ter que se dar

Mas tem que sofrer
Mas tem que chorar
Mas tem que querer
Pra poder amar”

Como diria o grande Camões, Vinicius é um fogo que arde e que se vê. Nas suas poesias, há sempre paixão, erudição e muito amor. Reservei para o final, o poema de Vinicius de Moraes que mais gosto – Eu sei que vou te amar -, cujos méritos são sobejamente conhecidos, de tal forma  que grandes vultos da música brasileira como Caetano Veloso, Tom Jobim, Ivete Sangalo, Elis Regina e Ana Carolina não resistiram a cantá-lo. Vale sempre a pena ouvi-lo, em qualquer interpretação.

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Bob Dylan galardoado com o Nobel da Literatura

Há mais de cinquenta anos que Bob Dylan batia à porta do céu com músicas e letras brilhantes como Like a Rolling Stone, Mr. Tambourine Man, Knockin´on a Heaven´s Door, Blowin´in the Wind, Don´t Think twice – It´s All Right, mas não podia ganhar prémios porque fumava umas “coisas esquisitas”, apesar das muitas coisas acertadas que as suas músicas «diziam».
Os anos foram passando e Dylan entrou no Olimpo dos grandes criadores onde assistia ao longo cortejo da mediocridade. De tempos a tempos, a velha lenda do rock americano lá se saía com mais uma música/letra incomodativa como “Things Have Changed”, em 2000, arrebatando o Globo de Ouro para melhor canção original do filme que lhe encomendou a banda sonora. No dia 13 de Outubro de 2016, aos 75 anos, a Academia Nobel resolveu usar Bob Dylan para dar um forte abanão num prémio – o Nobel da Literatura - que corria o risco de cristalizar e se institucionalizar. Finalmente a Academia Sueca percebeu que a grande literatura está muito para além dos livros. Muitos letristas e compositores de músicas foram e são grandes poetas. Mais revolucionários e interventivos na sociedade que tantos escritores clássicos.
A escolha de Bob Dylan para Prémio Nobel da Literatura simboliza essa mudança de paradigma. Por isso, este foi um dia importante para a literatura, para a poesia, para a música, para o próprio Prémio Nobel. Dylan foi usado como uma verdadeira pedrada no charco em que ameaçava cair este prestigiado prémio. E talvez seja esse o seu grande contentamento. Por uns tempos, vamos ouvir Dylan e prestar atenção à sua mensagem. Não vamos pensar nas coisas que ele fumava, mas nas coisas que escrevia e cantava. Podia ter sido outro? Podia. Podia ter sido, por exemplo, Chico Buarque, mas Dylan é americano e todos nós sabemos que uns são mais iguais que outros, como há «armas» que acertam melhor no alvo que outras.
Sobre Bob Dylan, despeço-me com o refrão de Things Have Changed
People are crazy and times are strange
I´m locked in tigth, I´m out of range
I use to care, but things have changed
Na verdade, as coisas mudaram, mas ele nunca deixou de se importar. Ainda bem para nós.