terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Never mind... Sex Pistols



Banda conhecida por apresentar letras anarquistas e posições revolucionárias. Do grupo, que surgiu em Londres no Verão de 1975, fazem parte Jonhny Rotten, o guitarrista Steve Jones, o baterista Paul Cook e o baixista Glen Matlock.
Os temas mais marcantes deste grupo punk são “Anarchy in the UK”e “God Save the Queen”.
O carácter singular da banda reside no facto de ter uma vertente revolucionária relativamente ao contexto (político, económico, social e, sobretudo, musical). De facto, no espaço de ano e meio, com dois singles e um álbum, iniciaram a revolução punk e transformaram para sempre a face do Rock n' Roll.

O inicio da revolução punk
Tudo começou numa boutique que se chamava SEX, propriedade da estilista Vivianne Westwood e do seu companheiro Malcolm Mclaren.
Em meados dos anos 70, havia um grupo de jovens que escapava ao estilo musical da altura.
Já se encontravam saturados do modelo de vida daquela época: não queriam a vida pré-programada dos pais, não acreditavam na utopia “peace & love”, nem nos cabelos compridos… Para estes jovens irreverentes e desviantes, a loja SEX funcionava como ponto de encontro. Ali, na jukebox passavam os New York Dolls ou Alice Cooper. Naquele recinto preconizava-se uma nova estética caracterizada por t-shirts rasgadas, correntes de cabedal e cabedal coçado. Paul Cook, Steve Jones e Glen Mastlock formavam os Swankers, funcionando como protótipo destes jovens revolucionários.


Anarquia lucrativa
Malcolm Maclaren era um empresário que fundou antes dos Sex Pistols uma outra banda:”New York Dolls”. No entanto, a experiência não foi bem sucedida. O sucesso só viria a ter com os Sex Pistols. Começou a agenciar a banda em 1975 ainda como Swankers. Mesmo assim, não era um grupo consistente, sendo mais projecto que banda. Faltava algo, ou melhor alguém …, visto por Vivianne Westwood. Esta recomendou á banda que investigasse um novo cliente que começara a aparecer na loja. Era Jonhnny Rotten, ainda actual vocalista da banda. O seu aspecto (transgressor) _Steve Jones recorda uma camisola do vocalista:”I hate Pink Floyd“_e as habilidades vocais, demonstradas na interpretação da música “I´m 18”(a rodar na jukebox) de Alice Cooper , permitiram-lhe ingressar na banda.
O carácter transgressor da banda consagrou-se no programa televisivo Today, quando praguejaram com o apresentador Bill Grundy. A situação desencadeou-se quando o apresentador “flirtou” com Siouxsie que acompanhara a banda. Steve Jones não gostou da atitude e chamou-lhe “velho depravado”.
Após os incentivos de Grundy , Jones prosseguiu com os insultos e no dia seguinte surgiram manchetes nos jornais sobre tal atitude da banda.

O punk tornara-se o inimigo público número 1 na Inglaterra. O comportamento transgressor da banda era perseguido não só pela imprensa musical, mas também pela imprensa escrita.
Perante tal contexto desfavorável, os concertos são agendados e cancelados logo de seguida.
Glen Matlock farta-se, segundo a sua versão, e sai da banda.
Em 1977, com Sid Vicious no lugar de Gen Matlock, a banda lança a segunda “bomba”:”god save the queen”, onde se evidencia um ataque contra todas as hierarquias sociais, centrado na rainha, símbolo de grande poder (estamos aqui perante uma grande afronta política, económica e social, levada a cabo através de uma música desconcertante mas reivindicativa). Apesar de censurada pela rádio e pela televisão, chegou ao topo das tabelas de vendas .
Em Outubro de 1977 é lançado o único álbum da banda:”Never mind the bollocks”.
O carácter caótico da banda ditaria brevemente o seu fim. Os concertos violentos, a toxicodependencia de Sid Vicious levaram Jonhny Rotten a sair. Em São Francisco, depois de cantar “No Fun”, dos Stooges, lançou uma questão ao público: “alguma vez tiveram a sensação de estar a ser enganados”, e abandonou o palco.
Sid Vicious mudou-se para Nova Iorque com a namorada Nancy e tentou uma carreira a solo , com o album sid sings . Mas, os execessos das drogas conduziriam-no a morte por overdose. Morreu enquanto aguardava julgamento pela morte da namorada.

De ameaça pública a mito
De facto, a polémica à volta de Jonhy Rotten permanece ainda na actualidade. Um dos casos mais flagrantes foi no verão de 2008. De acordo com o diário iol música, “O músico dos Bloc Party aproximou-se do membro dos Sex Pistols para lhe perguntar se ele estava a planear uma reunião com a banda Public Image Ltd., formada por Johnny Rotten depois de se separar dos Sex Pistols no final dos anos setenta.
Segundo as declarações de Okereke, Johnny Rotten atacou-o com um comentário «racista», afirmando que ele tinha «atitudes de negro». Depois daquele comentário, John Lydon atacou o vocalista dos Bloc Party provocando-lhe várias feridas na cara. Membros das bandas Kaiser Chiefs e Foals foram inclusivamente obrigados a intervir para evitar que o incidente ganhasse proporções maiores”.
Outra polémica também recente deu-se com Duffy, a cantora do êxito “Mercy”.
De acordo com um artigo da revista musical Blitz, “Jonh lydon, o irascível líder dos Sex Pistols, pô-la a chorar”. Tudo porque na cerimónia de entrega dos prémios Mojo, Duffy tentou abraçar lydon para uma fotografia.”O líder dos sex Pistols, que mais tarde disse não ter percebido quem era, terá empurrado a cantora com “sai daqui sua cabra. Nunca me toques”.

THE DOORS




Os The Doors foram uma das mais controversas e influentes bandas da cena musical dos anos 60, deixando um legado que inspirou muitas bandas e projectos musicais.
O nome do grupo surgiu a partir do título de um livro de Aldous Huxley, The Doors of Perception. Com Jim Morrison (n. 1943 – m. 1971) na voz, Ray Manzarek (n. 1939) nas teclas, Robbie Krieger (n. 1946) na guitarra e John Densmore (n. 1944) na bateria, os The Doors formaram um dos mais populares grupos da história da música, cuja sonoridade era dominada pelo órgão eléctrico de Manzarek e pela voz grave e sonora de Morrison, com a qual cantava os seus audazes textos poéticos.
Em palco, os The Doors ofereciam momentos de grande intensidade, dominados pela performance excessiva de Jim Morrison, que lhe custou problemas com a polícia.O carácter transgressor dominava esta “personagem”.


A discografia
O álbum de estreia, The Doors (1967), incluiu um dos seus mais aclamados clássicos: “Light My Fire”.
Seguiram-se Strange Days (1967), Waiting For The Sun (1968), The Soft Parade (1969), Morrison Hotel (1970), Absolutely Live (1970) e L.A. Woman (1971). Este último trabalho apresentou temas como “Hyacinth House”, “Riders On The Storm” e o tema-título.

Temas marcantes
Ficaram para a história temas intemporais tais como “The End”, “Not To Touch The Earth”, “Can’t See Your Face In My Mind”, “Love Me Two Times”, “People Are Strange”, “Hello, I Love You”, “Touch Me”, “Roadhouse Blues” e “Break On Through”, entre outros.
Após a morte de Jim Morrison, em 1971, o grupo gravou ainda dois álbuns, Other Voices (1971) e Full Circle (1972), mas sem qualquer sucesso. Em 1973, cessaram a actividade como grupo, mas o seu legado musical não parou de cativar novos admiradores.
Em 1979, Francis Ford Coppola escolheu “The End” para tema principal do filme Apocalypse Now.

Documentação biográfica sobre a banda
Em 1980, a edição de The Doors – Greatest Hits atingiu os dois milhões de discos vendidos e a biografia do grupo No One Here Gets Out Alive (1980), escrita por Danny Sugraman, foi um sucesso de vendas.
Em 1991, Oliver Stone retratou o percurso do grupo no filme homónimo, no qual o actor Val Kilmer interpretou o papel de Morrison.
Os The Doors foram uma das mais controversas e influentes bandas da cena musical dos anos 60, deixando um legado que inspirou muitas bandas e projectos musicais.

A figura de Jim Morrison
Músico norte-americano, vocalista do grupo rock The Doors, é uma das figuras mais carismáticas e mitificadas da história da música. De nome completo James Douglas Morrison, nasceu a 8 de Dezembro de 1943 em Melbourne, Florida. Estudou na Universidade de Los Angeles em 1964 e aí colheu a influência da poesia de William. Blake e Arthur Rimbaud e da filosofia de Friedrich Nietzsche.
Em 1965, juntou-se a Ray Manzarek (n. 1939, teclas), Robbie Krieger (n. 1946, guitarra) e John Densmore (n. 1944, bateria) para formar os The Doors. Os textos de Jim Morrison são dominados pela violência, pelo sexo, pelo álcool, pelas drogas e pela autodestruição, num constante desafio ao conservadorismo norte-americano que ele tentava levar à justa no seu modo de vida. Destruição de material do grupo, detenções por incitamento à violência e por atentado ao pudor em palco resultaram do excesso por que sempre pautou a sua vida.
Morreu aos 27 anos, a 3 de Julho de 1971, no seu apartamento de Paris. O seu corpo encontra-se sepultado no cemitério Père Lachaise, e a sua campa foi transformada em local de culto e de peregrinação pelos seus inúmeros fãs de todo o mundo.
O actor Val Kilmer interpretou a figura de Jim Morrison no filme “The Doors” (1991) de Oliver Stone.


O mito da morte de Jim Morrison
O mito em torno do falecimento de Morrison ajudou a elevar os Doors a um estatuto especial no mundo do rock.

Compilações de destaque
A compilação Legacy: The Absolute Best (2003) reuniu os grandes êxitos do grupo, destacando-se do alinhamento os temas mais clássicos como “Break On Through (To The Other Side)”, “Love Me Two Times”, “People Are Strange”, “Five To One”, “Roadhouse Blues”, “L.A. Woman” e “Riders On The Storm”.


Contigo torno-me real
Livro português sobre Doors ganha menção honrosa no Festival do Livro de Londres
Rui Pedro Silva é jornalista e autor do livro ”Contigo torno-me real “ . O anúncio dos vencedores foi feito no passado dia 10, mas a entrega dos prémios ocorreu no dia 17 de Dezembro em Londres. A obra recebeu uma menção honrosa na área de não-ficção.
Rui Pedro Silva, 32 anos, considerou esta menção honrosa uma “agradável surpresa”, até porque o livro foi apresentado a concurso em edição portuguesa.
“Contigo torno-me real” foi editado em Portugal em 2003 pela editora Afrontamento como uma obra sobre o culto a Jim Morrison, vocalista do grupo norte-americano Doors, falecido em 1971 aos 27 anos.
Em Março deste ano, Rui Pedro Silva reeditou uma segunda versão desta obra. Aí para além de contar a história de Jim Morrison foca também a dos Doors, através de testemunhos e documentos . 

A obra ultrapassa as 500 páginas. “Deste ponto de vista acho que o livro é único no mundo, porque reúne depoimentos inéditos”, sublinhou Rui Pedro Silva. Entre eles contam-se, por exemplo, os de Bill Siddons, agente dos Doors entre 1968 e 1972, e de Jac Holzman, fundador da Elektra Records, que lançou o grupo, e que assina o prefácio do livro. Há ainda participações de importância dos Doors na sua formação musical, como Zé Pedro, Pedro Abrunhosa, Jorge Palma, Rui Reininho, Tiago Bettencourt e a fadista Mariza.
O autor, com formação em jornalismo e eleito em 2003 o maior fã português dos Doors, dedicou seis anos de trabalho ao grupo norte-americano, focando as diferentes facetas da banda e reunindo vários testemunhos.
Apesar de ser admirador dos Doors – “já faz parte do meu ADN” -, Rui Pedro Silva disse que este livro não foi feito na perspectiva de um fã, mas com um sentido factual, “com um forte sentido de jornalismo de investigação”.
“Os Doors foram uma banda muito completa. Não era só a música, havia também o cinema, a forte influência literária, de Rimbaud, de William Blake, da Beat Generation, e pouca gente sabe disso. A morte prematura de Jim Morrison fez com que se falasse apenas dos excessos dele”, disse.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

Mark Knopfler, «Sultans of Swing»

Contexto: Álbum de estreia dos Dire Straits, 1978. Knopfler escreveu esta canção numa guitarra acústica ao estilo de Bob Dylan, depois de ter visto uma banda a tocar num pub. É a história impressionista de um grupo de músicos que toca por divertimento numa sexta-feira à noite, em Londres; inclui personagens como “Harry” e “Guitar George”. Knopfler era, na altura, professor, pelo que esta vinheta lhe chamou a atenção: Não pretendia fazer parte de uma banda deste tipo, mas sim, seguir a carreira musical.
mark knopfler dire straits (8)

“Estremecemos nas trevas, chove no parque, mas entretanto… a sul do rio paramos e não pensamos em mais nada…” Quando Knopfler compra uma Fender Stratocaster, altera a melodia mas mantém a letra. Adota os acordes de Del Shannon em «Runaway». Desenvolve uma técnica irónica, contrastando o lirismo na guitarra com um estilo vocal “adequado”. Ao ouvir Live at the Regal, de B.B. King, apercebe-se de que a guitarra pode ser um complemento da voz e decide tentar a sua própria versão desta abordagem.

Em 1978, no meio do boom do punk rock, «Sultans» foi uma pedrada no charco, visto que ninguém tocava neste estilo. Mas qual? Com influências dos blues e de JJ Cale, Knopfler criou algo que ainda hoje é referido como “estilo”. Frase comum: “Se pusermos muitas guitarras nesta gravação, parece Dire Straits”, criticou alguém. Pois, mas qual é esse Estilo?
É imediatamente identificável. Knopfler segue as escalas ortodoxas dos acordes, não se deixando limitar nem intimidar por elas. É uma guitarra límpida, com alguma compressão e uma tonalidade líquida. As notas não são subidas meio-tom, mas 1/3. Há um uso sincopado das double e triple stops – conjunção de duas ou três notas em uníssono, para criar uma afirmação – repare-se no riff constante que pontua o tema. Não se pode dizer que é country, rock ou blues, especificamente. É o tal “estilo Dire Straits”, por vezes tão renegado por ser tão despido de artifícios.
mark knopfler dire straits (30)

Situação real: Um eletricista que nos vem compor o quadro a casa. “Este tipo que tem aí a tocar… dedos de ouro. Conheço-o logo.” Nem sabe o apelido húngaro, e o nome da banda pode não lhe dizer nada. Mas o som é imediatamente cativante. Apela a todas sensibilidades. Ora, isto é algo raro, digno de Gershwin. E podemos identificar facilmente um tema de Chopin, mas o intérprete é mais difícil.
O primeiro solo de «Sultans of Swing» é um intermezzo com uso criativo de arpeggios. O segundo (e famoso) solo está longe da pirotecnia ao estilo de Van Halen. Mas a sobreposição dos acordes às notas resulta na perfeição, embora não seja uma equação complicada. É, ainda assim, matemática, e uma questão de contexto.
John Illsley, Mark, Pick Withers e David Knopfler, o quarteto que gravou o lendário «Sultans».
John Illsley, Mark, Pick Withers e David Knopfler, o quarteto que gravou o lendário «Sultans».

No mesmo álbum, «Down to the Waterline» é um tema de execução mais difícil e de maior complexidade, mas não é mais imediatamente identificável do que o solo sincopado de Knopfler com três acordes como pano de fundo, que todos reconhecem em «Sultans of Swing».
O mérito do compositor foi a criação de uma paleta. Havia muito mais a dizer… Neste caso, trata-se apenas de um guitarrista com apelido de pronúncia difícil, uma ideia que se afigura fácil e algo a transmitir. Parte tudo daqui. O génio, isto é.

Faixa original com apenas a guitarra e a voz:


sábado, 7 de novembro de 2015

U2 - Under A Blood Red Sky (Live), editado há 32 anos.

Pouco antes da consagração via Live Aid, em 1985, já me eram familiares muitas canções dos U2: "Fire", "October", "Seconds", "Bad" ou "Pride". O som dos irlandeses era sólido, arrojado e as letras denotavam empenhamento político e social. No entanto, faltava-me descobrir o quarteto no formato live. A revelação aconteceu em 1984 ao sabor das oito canções que compunham "Under A Blood Red Sky". O material incluído no disco consistia em actuações na Alemanha e nos Estados Unidos da América, durante a digressão de 1983. E era a prova provada do encantamento que os U2 destilavam no público. Em termos instrumentais significava a consagração de The Edge e da sua manipulação brilhante dos trastes da guitarra através de solos memoráveis. Por seu turno, o baixista Adam Clayton mostrava elasticidade, versatilidade e Bono era o mestre de cerimónias perfeito na arte de cantar e transportar as plateias. Com "Gloria" operava-se a transformação numa boa faixa de rock e "New Year´s Day" claramente ultrapassava a versão de estúdio. Mas, "I Will Follow" é merecedora de uma nota de destaque com a "boa agitação" da guitarra de The Edge e "40" constitui-se como a elegia doce-amarga de que não se consegue escapar. O grande momento do álbum acaba por ser "Sunday Bloody Sunday"  com a sua estridência e síntese de sentimentos religiosos e políticos, animada por um riff memorável e uma vocalização certeira. Depois de "Under A Blood Red Sky" os U2 embarcaram numa aventura que lhes trouxe grandes discos de originais, particularmente "Achtung Baby", estádios cheios e reconhecimento global. Ainda assim, o tempo não apaga quarenta e poucos minutos de encantamento, descoberta e magia.

terça-feira, 20 de outubro de 2015

BOY, o 1º álbum dos U2, editado há 35 anos.


Sempre achei interessante o início de carreira de bandas ou artistas consagrados, com um longo percurso percorrido, inúmeros álbuns e um estatuto que poucos atrever-se-ão a pôr em causa. Mas toda esta fama e glória, faz com que a maioria do público esqueça ou desconheça o tempo em que tudo começou. Há de tudo, desde inícios fulgurantes que depois se eclipsam com o tempo a começos mais discretos que se transformam em grandes carreiras. Os irlandeses U2 são o melhor exemplo destes últimos, e cujo primeiro álbum, Boy, foi editado há 35 anos. 
Se há bandas ou artistas cujos primeiros álbuns foram marcantes para a afirmação de carreiras, os U2, que hoje em dia estão na primeira divisão da música, em 1980, aquando do lançamento de Boy, nada previa que se tornassem no fenómeno (não apenas musical) que são hoje. Não estando a pôr em causa a qualidade do álbum de estreia, do qual resultaram excelentes temas como I Will Follow, Into the Heart, Out of Control, Stories for Boys ou A Day Without Me, o que é certo é que apesar da critica favorável não terá sido o " clic " para o sucesso imediato. O que por vezes não é o mais importante já que inícios de carreira fulgurantes rapidamente se esgotam em vazios criativos. A carreira dos irlandeses, pelo contrario, foi feita de passos seguros, culminando no mega-álbum The Joshua Tree, sete anos mais tarde. Prova de que o sucesso e o reconhecimento podem demorar... mas perduram. Voltando a Boy, estamos perante um bom registo rock marcado ainda pela atmosfera cinzenta do post-punk, com a guitarra de The Edge a voz de Bono a imporem-se. Produzido pelo consagrado Steve Lillywhite (Peter Gabriel, Morrisey, Big Country, Simple Minds, entre outros), Boy não conseguiu melhor do que um 52º lugar no top britânico. O single de apresentação I Will Follow, escrito por Bono na sequência do falecimento da sua mãe, falhou a presença na tabela de vendas britânica mas continua a ser um dos temas mais marcantes e preferidos dos fãs, o único tocado em todos os espectáculos realizados pela banda. Deixo-vos então com o primeiro video de I Will Follow...
1º Álbum - Boy - 1980
  1. I Will Follow
  2. Twilight
  3. An Cat Dubh
  4. Into The Heart
  5. Out Of Control
  6. Stories For Boys
  7. The Ocean
  8. A Day Without Me
  9. Another Time, Another Place
  10. The Electric Co.
  11. Shadows And Tall Tree

domingo, 18 de outubro de 2015

Laurie Anderson: Os 33 anos de Big Science

Big Science, o álbum de estreia de Laurie Anderson, foi editado há 33 anos e, em 2015, a autora completou 68. A influência de Anderson ultrapassa as fronteiras da música, já que sempre explorou os efeitos da tecnologia nas relações interpessoais e na comunicação humana.

“Boa noite, fala o capitão… estamos prestes a fazer uma aterragem de emergência…” Assim começava o disco de 1982, Big Science, álbum que surgiu na sequência do êxito de «O Superman». O single foi uma edição da autora, destinada à venda direta pelo correio.
O preço era 3,98 dólares (incluindo portes). “Como é que as pessoas sabiam que tinha sido editado? Escreviam-me ou telefonavam-me, perguntando se eu tinha uma cópia. E eu punha um selo e enviava.”
A cantora explica que recebeu um telefonema de um inglês que lhe pediu diversas cópias do single. “Eu perguntei, ‘quantas?’. Ele disse, ‘40 mil até ao fim desta semana e outras 40 mil na semana que vem…’ Respondi, ‘ok… já lhe ligo!…’”
Adotando uma perspetiva comercial, a produtora Roma Baran achou que era altura de aproveitar o momento e realizar um projeto mais ambicioso. A reação dos produtores que ouviam o tema era: “Adoro. É a coisa mais fantástica que já ouvi. Mas o que hei-de fazer com isto? Dura oito minutos e meio, não tem bateria nem baixo, ninguém o vai tocar na rádio.”


No entanto, depois da resposta positiva da Warner Brothers, Anderson e Baran começaram a trabalhar num álbum, sem as restrições dos estúdios pagos à hora. “Foi empolgante fazer um disco para uma grande editora”, reflete Laurie.
O método de trabalho de Anderson começava com algo nada parecido com uma canção, mas sim, com um som ou um “loop”. «From the Air», por exemplo, baseia-se num padrão de vocoder, um analisador e sintetizador de voz.

LAURIE É UM VÍRUS

Artista multifacetada e enigmática, Laura Phillips Anderson sempre foi original: O seu primeiro trabalho artístico, em 1969, foi uma sinfonia tocada em buzinas de automóveis.
Nasceu no Illinois, a 5 de Junho de 1947 e licenciou-se em História da Arte na Califórnia. No início dos anos 70, foi crítica de arte em revistas e ilustrou livros para crianças. Em 1972, obteve um Master’s Degree in Fine Arts em escultura, na Universidade de Columbia. Durante os anos 70, atuou em Nova Iorque, tornando-se conhecida pela sua performance Duets on Ice, em que tocava violino ao som de uma gravação, com os patins dentro de um bloco de gelo. A atuação só terminava quando o gelo derretia.
«O Superman» alcançou o número dois das tabelas de vendas inglesas. O tema era apenas parte de um trabalho intitulado United States I-IV. O som exótico de Big Science resultou do uso revolucionário de diversas tecnologias e instrumentos. O álbum obteve ótimas críticas em publicações como o New York Times, em que o crítico John Rockwell exaltou o disco: “O trabalho de Anderson é diferente de tudo na música e altamente recomendado.” Não deixa de ser irónico que, anos antes, Rockwell tenha sido um dos alvos de Lou Reed nas provocações de Live: Take no Prisoners: “John Rockwell diz que sou inteligente. Fuck you! Não preciso que mo digas.”
Ao longo dos anos 80, o trabalho avant-garde de Anderson obteve quase sempre o consenso entre as vendas e a crítica. Realizou e participou no filme Home of the Brave, em 1986, e compôs diversas bandas sonoras. Em 1989, Strange Angels, um dos seus álbuns mais acessíveis, dividiu opiniões, com os críticos a aplaudirem a vertente mais melodiosa de Laurie, (cujas lições de voz atrasaram a edição do álbum) e os fãs indecisos perante o novo caminho.

O SUPERWOMAN

Nos anos 90, Anderson prosseguiu a sua carreira multifacetada. Descreveu os seus primeiros espetáculos ao vivo no livro Stories From the Nerve Bible, publicado em 1993. Deu voz a um filme animado, editou Bright Red, co-produzido por Brian Eno, e criou diversas apresentações multimédia, entre as quais, uma inspirada por Moby Dick. Depois de um interregno, regressou com Life on a String, de 2001.
No mesmo ano, Anderson fez uma digressão, interpretando as suas peças mais conhecidas e confirmando a contemporaneidade do seu trabalho. Interpretou «O Superman», uma semana após o 11 de Setembro. A letra diz, “aí vêm os aviões; são aviões americanos; feitos na América…”. O concerto foi retratado no álbum Live in New York, editado em 2002.
Ao longo dos anos, Anderson colaborou com artistas tão diferentes como Peter Gabriel, David Sylvian, Jean-Michel Jarre, Brian Eno, Bobby McFerrin ou Dave Stewart. No novo milénio, Laurie Anderson narrou um documentário sobre Andy Warhol e atuou em Came So Far For Beauty, um tributo a Leonard Cohen, em 2006.

LAURIE E LOU

Desde meados dos anos 90, Anderson é companheira de Lou Reed, tendo ambos colaborado musicalmente diversas vezes: Anderson participou em «Call On Me» do álbum The Raven, em «Rouge» e «Rock Minuet» de Ecstasy, e «Hang On To Your Emotions» de Set the Twilight Reeling. Lou Reed, por seu lado, participou em «In Our Sleep», do álbum Bright Red e «One Beautiful Evening» de Life on a String.




































No 11 de Setembro, Reed estava separado de Anderson. A primeira coisa de que se lembrou foi da companheira, escrevendo-lhe o poema «Laurie Sadly Listening», publicado na New York Times Magazine a 6 de Outubro de 2001: Laurie if you’re sadly listening/The birds are on fire/The sky glistening/While I atop my roof stand watching.

ESTRANHAMENTE ATUAL

Tanto a nível temático como musical, Anderson sempre esteve adiantada em relação aos tempos, embora cantasse, em 1982, “this is the time, and this is the record of the time”. Mas a “grande ciência” de Laurie é do nosso tempo também. Na época, Laurie apercebeu-se da ansiedade sociopolítica da sociedade americana e do anseio quase obsessivo por segurança, numa época de ofensivas militares por parte de um país que nunca esqueceu as cicatrizes do Vietname.
O conforto gélido da tecnologia que aproxima e afasta os seres humanos parece prever a Era da Internet.
Em «The It Tango», explora a dificuldade que os homens e mulheres encontram em falar a mesma linguagem.


O material bónus da reedição de Big Science – Enhanced (2007), inclui «Walk the Dog» o lado b de «O Superman», o vídeo do tema e apontamentos de Laurie Anderson acerca do álbum. Ao longo dos anos, o encanto hipnótico das composições de Anderson deu bastante trabalho aos críticos, que se esforçaram por traduzir a sua música em palavras. Andy Gill escreveu, no New Musical Express: “Há uma qualidade onírica e subconsciente nas suas composições, que as faz trabalhar a um nível psicológico mais profundo.”

Paul Simon - Graceland

Editado em 1986, vendeu 14 milhões de cópias em todo o mundo. Venceu o Grammy por Melhor Álbum e, no ano seguinte, o de Melhor Canção, algo sem precedentes. Os seus três singles foram um sucesso e Paul Simon promoveu o álbum na estrada durante cinco anos, cantando com a lendária Miriam Makeba e os Ladysmith Black Mambazo, entre outros.
paul simon under african skies (6)

RAÍZES

Apesar do título remeter para um “estado de graça”, mais do que para a famosa mansão de Elvis – coincidência que só lhe ocorreu depois –, o álbum foi despoletado por uma fase má. Hearts and Bones, de 1983, foi o primeiro projeto de Paul Simon que fracassou comercialmente, embora hoje seja visto a outra luz. No mesmo ano, Paul formaliza a relação com a atriz Carrie Fisher (a ‘Princesa Leia’ de Star Wars), mas o casal divorcia-se seis meses depois.
Simon e Carrie Fisher.
Simon e Carrie Fisher.

Nas palavras de Simon, “quando se tem um fracasso pessoal aliado a um fracasso artístico, pode-se entrar em parafuso. Foi o que me aconteceu. As coisas só melhoraram quando comecei a ouvir música sul-africana. Um amigo emprestou-me uma cassete que eu ouvia no carro.”
“Ninguém achou grande ideia. Disseram, ‘vai usar ritmos africanos para revitalizar a carreira’. Mas, quando sabemos que ninguém está a observar, podemos fazer o que nos apetecer.”

IDEIAS E REALIDADES

Graceland causou polémica quando Paul Simon foi a Joanesburgo gravar com músicos locais. “Isso não é nada a não ser roubar!”, acusou um estudante negro numa conferência que Simon deu. O músico respondeu, nervoso: “Achas que é fácil criar um disco assim? É só dizer, ‘vou até lá, arranjo uns músicos, faço umas letras, edito isto e já está’? Achas que conseguias fazer um sucesso disto?” As letras foram escritas com base nos ritmos e nas músicas, mas foi a conjugação de poesia urbana, amores falhados, problemas de comunicação e a ânsia por chegar a um entendimento com uma pessoa ou uma cultura, que fizeram de Graceland um disco universal.
A cassete que um amigo emprestou ao músico e que despertou nele o interesse pela música africana.
A cassete que um amigo emprestou ao músico e que despertou nele o interesse pela música africana.
Paul Simon foi também acusado de quebrar o boicote cultural das Nações Unidas à África do Sul, algo que fez inadvertidamente. “Eu achava que era só para músicos que lá fossem tocar. Não penso que esse boicote se destinasse a impedir que a cultura e a arte sul-africanas fossem divulgadas no mundo.” De resto, foi assim que os músicos negros encararam a questão, apreciando o gesto apolítico de Simon e agradecendo a exposição internacional que deu à cultura musical africana.
O Apartheid causou-lhe inúmeros transtornos; deu concertos sob ameaça de bomba e atuou com uma rede entre o palco e público. O irmão de Joseph Shabalala, (líder dos Ladysmith Black Mambazo) foi assassinado de maneira violenta: Um tiro na cara. Perturbado com o que considerou um crime racista, o cantor chorou em palco. Mas Shabalala apoiou Paul Simon: “Não o considero um amigo. Considero-o um ser humano. Um irmão.”
Para Simon, o projeto era “o mesmo que dizer, ‘entendemo-nos musicalmente. Porque não passar isto para o plano da realidade’?” No entanto, em 1992, já na digressão Rhythm of the Saints, as ameaças prosseguiram e o escritório do promotor de um concerto foi alvo de um ataque à granada.

IN MY LITTLE TOWN

paul simon under african skies (2)Um dos raros cantores/compositores que conjuga quase sempre o reconhecimento da crítica com o sucesso comercial, Paul Simon nasceu em Newark, New Jersey, em 1941, e cresceu em Queens, Nova Iorque. Conheceu Art Garfunkel em 1956. Decidem atuar sob o nome “Tom and Jerry” e gravam o single «Hey, Schoolgirl», número 49 nas tabelas de vendas, sucesso assinalável para dois adolescentes, mas que não teve continuidade. Simon queria seguir a carreira musical, mas licenciou-se em Línguas e Literaturas Modernas. Era um autodidata, embora fosse já um guitarrista exímio. No início da década de 60, escrevia canções para outros artistas, gravando as “demos” sob pseudónimos. Entretanto, o duo tenta novamente o mundo da música.
Quando gravaram o primeiro disco “sério”, Wednesday Morning 3 A.M. (1964), a denominação “Tom and Jerry” não se adequava. A solução foi usar os apelidos. Como disse Mike Nichols, realizador de The Graduate, “naqueles tempos, nenhum artista tinha um nome como Garfunkel… era preciso lata”. Mas o álbum não vendeu e Simon partiu, desanimado, para Inglaterra. 1965 foi o ano do folk-rock de Bob Dylan. A Columbia decidiu lançar o single «The Sounds of Silence» adicionando guitarras elétricas e bateria, com o desconhecimento da dupla. A canção chegou a número 1 do top, e Simon regressou aos EUA, gravando, com Garfunkel, o álbum homónimo, dando continuidade ao sucesso inesperado.
paul simon under african skies (13)
Simon e Garfunkel eram amigos, mas, com as pressões e as constantes digressões, a relação começou a desagregar-se. Simon era pacato, reservado e metódico; sentia-se mais à vontade no estúdio, onde era perfecionista. Ao vivo, custava-lhe lidar com a atenção. “Nesse aspeto, o Art deu-me a autoconfiança que me faltava.” Garfunkel explica que “Paul não pareceu muito divertido com o nosso sucesso”. De facto, as canções sobre suicidas, solidão e alienação refletiam o humor de Simon, o que veio a provocar algumas batalhas com a depressão.
A dupla conquistou o Grammy para melhor álbum do ano com Bookends, em 1966, e The Graduate, em 1969, mas o auge do sucesso foi Bridge Over Troubled Water, vencedor absoluto dos Grammies de 1970. Ironicamente, foi o fim; a tensão acentuara-se, com Garfunkel a querer seguir uma carreira no cinema e Simon a querer enveredar por outros estilos musicais.
paul simon under african skies (11)
Simon começa uma fulgurante carreira a solo, com o álbum homónimo de 1971. Durante a década de 70, lançou êxitos como «Kodachrome» ou «Me and Julio Down By the Schoolyard». As ligações com o cinema pareciam fortes, chegando a entrar em Annie Hall de Woody Allen. No final da década, os problemas contratuais obrigaram a um afastamento, mas regressou em 1980, escrevendo o argumento e compondo a banda sonora de One-Trick Pony.
O filme foi um flop, mas a banda sonora integrava temas como «Late in the Evening». No ano seguinte, Simon e Garfunkel reúnem 500 mil pessoas no Central Park para um concerto histórico. Planeavam lançar um disco de inéditos, mas os desentendimentos do passado reavivaram-se, e Simon lançou o álbum a solo: Hearts and Bones.

CURIOSIDADE SOBRE OUTRAS CULTURAS

Quem conhece a carreira de Paul Simon, sabe que esta curiosidade por outros ritmos começou no final dos anos 60, com «El Condor Pasa», ainda num álbum de Simon & Garfunkel. No primeiro álbum a solo, arriscou o reggae e ritmos brasileiros. Estudou a música de Tom Jobim e saiu-se com Still Crazy After All These Years, em 1975, vencendo o Grammy de Melhor Álbum.
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Recentemente, tem gravado poucos álbuns, mas mantido um nível de qualidade notável. Ainda assim, não conseguiu evitar polémicas. No musical The Capeman, acusaram-no de “glorificar um assassino”, por exemplo.
Há 20 anos, Philip Glass disse: “Temos de ouvir “Gershwin, Cole Porter e Irving Berlin para encontrar um talento comparável ao de Simon.”
Nos anos 90, perguntaram a Carrie Fisher quais as canções que o ex-marido mais apreciava. “Ela não gostava nada do «I Am a Rock» e outras coisas… mas de Graceland, sim. Orgulhava-se disso. De todo esse trabalho.”

Mark Knopfler

No Hurlingham Club londrino a 9 de setembro de 2009.

Mark Knopfler é dos poucos músicos veteranos que consegue inspirar curiosidade pelo seu regresso. Já deram o seu nome a um dinossauro – Masiakasaurus knopfleri –, o que o divertiu, até porque os investigadores estavam a ouvir Dire Straits quando o descobriram. Desde o início, Knopfler foi a prova de que um grupo pode ser interessante apenas pela música e não pelas declarações bombásticas, pelo visual espampanante ou o exibicionismo.
mark knopfler dire straits (39)O quarteto que surgiu em 1977 era composto por um ex-baterista de jazz introvertido, um baixista que movia os pés como um pinguim e um jovem silencioso de cabelo comprido. A este trio juntava-se um guitarrista que entrava em palco de impermeável e cabelo despenteado – parecia ter passado o dia a trabalhar como estafeta. O frontman deste belo ramalhete era filho de um arquiteto judeu, cujas simpatias comunistas o obrigaram a fugir da Hungria. Os pais estabeleceram-se em Glasgow, na Escócia, onde Mark nasceu, tendo passado a infância na cidade inglesa de Newcastle, de onde a mãe era originária.
A voz grave de Knopfler contrastava com os sons líricos que extraía da guitarra, característica que mantém. Os tons de diamante da Stratocaster pontuam a beleza das melodias. Mark tem tido sempre uma dualidade: Temas românticos contrapostos a análises mais sombrias e irónicas dos tempos. Um cronista musical com influências literárias, criou temas em que o tom resignado se associa a frases de guitarra melodiosas.

OS QUATRO DO APOCALIPSE

«Dire Straits» significa «Mark Knopfler». Com uma imagem que faria estremecer qualquer publicitário nos dias de hoje, o grupo passara meses a ensaiar num cubículo fumarento de um apartamento minúsculo em Deptford, Londres. «Dire Straits» (terríveis apertos) foi o comentário de um amigo às condições em que os quatro viviam. Mark era, já nessa altura, o génio por detrás do som. Um dos guitarristas mais elegantes de sempre, criou uma sonoridade fluída, versátil e veloz, inspirando-se em Chet Atkins e J.J. Cale. “As pessoas mais criativas são esponjas”, disse certa vez. “Absorvem uma coisa e expulsam outra.” Usava poucos efeitos, apenas um compressor e um pedal de volume.
Depois de absorver o boogie-woogie, a country e os blues, o canhoto Knopfler foi obrigado a tocar violino como um destro. Mais tarde, ao dormir em casa de amigos, pegou numa guitarra acústica com cordas finas e descobriu que, ao apoiar dois dedos na caixa com a mão direita, conseguia extrair um som diferente. Adormeceu a tocar guitarra e a ver Once Upon a Time in the West. E o estilo foi-se desenvolvendo.
Quando era jornalista, passava as noites a tocar guitarra. Primeiro, um acorde, depois outro. Quando eram cinco da manhã, deitava-se e, de manhã, alguém da redacção dizia, “telefonem ao Knopfler”. Os colegas estranhavam o ar sonolento. De início, era lento na máquina de escrever, mas começou a acertar com as teclas, “tal como acertava com as notas da guitarra”.
“Não canto bem. Tentei fazer da guitarra a minha voz.” Desde que deixou de fumar, Knopfler fez progressos vocais, que se podem notar em todos os álbuns a partir de Shangri-La. Em All the Roadrunning, álbum de duetos com Emmylou Harris, compôs quase todos os temas e canta harmonias sem problema, o que é um feito, já que está ao lado da rainha da country.

NÃO HÁ DEMOCRACIA NAS BANDAS

mark knopfler dire straits (53)Os quatro músicos gravaram uma “demo” enviada para o DJ Charlie Gillett, que reconheceu algo de inovador numa canção chamada «Sultans of Swing». Utilizando a guitarra como extensão e complemento da voz, Knopfler tornou conhecido o seu apelido húngaro. Assistira a um grupo de músicos de jazz a tocar num pub londrino e fez disso uma história. Adicionou-lhe um solo matemático sobreposto a três acordes, que, apesar de não ser uma pirotecnia, provou ser eficaz.
Os Dire Straits fizeram várias digressões longas e esgotantes pelos Estados Unidos, com Knopfler a acabar, a maior parte do tempo, num dos lugares da frente da camioneta, incapaz de comunicar com a banda ou com o público, mergulhado numa depressão. Motivo: Holly Beth Vincent, a vocalista dos Holly and the Italians. Os Straits regressaram com o seu melhor álbum Making Movies, em 1980. «Romeo and Juliet», uma das suas melhores canções, foi diretamente inspirada na relação com Holly Vincent, que o guitarrista sempre se escusou a comentar. A cantora disse, numa entrevista, “oh, Knopfler, yes, I used to have a scene with him”, afirmação que o feriu e que é citada no tema.
O irmão, David, incentivou-o a escrever algo sobre o tempo em que eram miúdos em Newcastle, e iam ao parque de diversões. O resultado foi «Tunnel of Love». O produtor Jimmy Iovine comentou: “O álbum parece uma música inteira.” Mark desentende-se com David durante as gravações e despede o irmão. Começa a ser considerado um mastermind, mas também um indivíduo calculista.
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“Os grupos não funcionam com base na democracia. É raro. Tem de existir alguém que lidere. E o Mark era indiscutivelmente essa pessoa”, comentou um observador. “Isso trouxe-lhe muitos dissabores.”
Em 1983, produziu Infidels, de Bob Dylan. As coisas nem sempre correram bem e Knopfler terá abandonado uma das sessões bastante perturbado. Quando entrevistei Mick Taylor, ex-guitarrista dos Rolling Stones, perguntei-lhe como correram as gravações. Este respondeu que gostou imenso de trabalhar com Dylan, mas que Knopfler lhe inspirou uma certa antipatia, já que se comportava de modo “ditatorial”. Contudo, há muitos anos que Dylan não tinha um álbum tão bem produzido.
O baterista Pick Withers foi a baixa seguinte. “Se continuasse nos Dire Straits, seria milionário por esta altura, mas não sei que tipo de pessoa seria.” A partir daqui, Knopfler começou a contratar músicos e a dizer-lhes exatamente o que tocar.
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“TUDO TEM DE SE ENCAIXAR”

A principal característica de Mark Knopfler é a diversidade do seu talento enquanto guitarrista, compositor, letrista, produtor, alguém que possui uma visão global da música. As palavras que utiliza são musicáveis, perfeitamente enquadradas na melodia como um tiquetaque, ao estilo da música brasileira. Escolhe guitarras de determinado ano para um solo e regozija-se com esses desafios. “Tudo tem de se encaixar. Adoro fazer digressões, gravar, ensaiar, todos os aspetos desta profissão. Se assim não for, acaba em lágrimas. É preciso um grande ímpeto para lançar uma banda de garagem. Se não o tens, esquece”, referiu numa entrevista.
mark knopfler dire straits (40)Em 1988, antes do concerto de homenagem a Nelson Mandela, afirmou: “Tudo isto, atrás de mim [apontando para as guitarras e equipamento] não significa nada. Tive os meus filhos e apercebo-me que tocar num palco é entusiasmante, mas não deixa de ser uma treta completa.”
Contudo, Mark Knopfler faz discos porque quer, já é multimilionário desde meados dos anos 80. Não queria ressuscitar os Dire Straits para o último disco e digressão de On Every Street. Foi pressionado pelas dificuldades económicas dos outros elementos e também pelo interesse dos fãs.
“Um executivo da editora diz-nos que quer um novo álbum. Mas é diferente quando um tipo nos vem arranjar o vídeo a casa e diz, ‘olá, Mark, para quando um novo disco?’”
Com o renascimento de Golden Heart, em 1996, Knopfler começou a utilizar mais a Gibson Les Paul, explorando uma sonoridade densa. A sua costela escocesa revelou-se na música que compôs. “Pensei que era irlandesa. Mas um dos músicos disse-me, ‘não, é escocesa’. E perguntei-lhe, ‘como sabes?’ E ele respondeu, ‘nota-se pelos intervalos’.” Colaborou com os Chieftains e, no DVD A Night In London, agradeceu a colaboração de alguns elementos, depois de um tema: “Vemo-nos no bar…”
O fim dos Straits coincidiu com a estabilidade emocional que encontrou com a atriz Kitty Aldridge, há mais de 15 anos, embora Mark continue a abordar o romantismo do ponto de vista de um Gershwin. O trilho de migalhas de pão – citado em «True Love Will Never Fade» – conduz o narrador ao sítio onde deveria estar. Um tema sobre um artista de tatuagens assume, deste modo, um significado ambivalente.

O REPÓRTER MUSICAL

As suas canções, embora se tenham tornado estandartes do rock FM, baseiam-se sempre em ideias. Ao ouvir os reparos de um lojista acerca das estrelas da MTV, Knopfler escreveu «Money for Nothing». «Calling Elvis» inspira-se numa frase do cunhado, “quando tentas telefonar à tua mulher, parece que estás a ligar ao Elvis”.
«Brothers in Arms» foi inspirada por uma frase do pai, durante a guerra nas Falkland:
“Disse-me que os russos e os argentinos eram camaradas de armas. Que a Rússia comunista era ‘camarada de armas’ com a ditadura militar da Argentina. E o termo ficou-me, embora a canção não seja sobre isso. Lembrei-me de um soldado a morrer no campo de batalha, talvez com alguns camaradas à volta… e a ideia de mundos antagónicos dentro de um só mundo. Julgo que deve ter passado pela cabeça de muitas pessoas, quando estão à beira do penhasco… é estúpido. Somos estúpidos em participar em qualquer guerra.”
Mark Knopfler escreveu «Private Dancer», durante as sessões de Love Over Gold, mas achou que o tema precisava de uma vocalista. Encontrou-a em Tina Turner, ofereceu-lhe a canção e deu um impulso decisivo ao relançamento da cantora, nos anos 80. Foi distinguido em 1993 pela Universidade de Newcastle e, em 1995, pela Universidade de Leeds. Recebeu uma terceira honra da Universidade de Sunderland, reconhecendo o seu trabalho excecional enquanto músico.
O detetive Marlowe, de Raymond Chandler, inspirou «Private Investigations». «Your Latest Trick» baseia-se num dia em que regressava do estúdio, em Nova Iorque. “Os taxistas, uma canção no rádio… sempre gostei da ideia dos camiões de lixo nova-iorquinos. São gigantescos, monstruosos e fazem um ruído incrível. São bestas pré-históricas. Uma coisa leva à outra. Temos fragmentos e, muitas vezes, construímos as canções a partir disso.”
Escreveu sobre dois paparazzi em «Vic and Ray», sobre as mulheres viciadas em compras em «Imelda», sobre um fã fanático em «Rüdiger», ou sobre os excessos dos “roadies” em «Heavy Fuel». Descreveu o West End londrino, e relatou “um penoso espetáculo de cabaré gay” em Munique, no tema «Les Boys». Muito do álbum On Every Street, que marcou o regresso dos Dire Straits em 91, é negro e opressivo, o que se deve à fase terminal do seu segundo casamento.

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O HOMEM NÃO MUDOU MUITO

«Ticket to Heaven» é uma crítica mordaz aos evangelistas televisivos, enquanto «Devil Baby», em tom irónico, descreve os tristes espetáculos dos reality shows de Jerry Springer. Os Estados Unidos sempre fascinaram o músico a vários níveis. Porém, Mark observa o país a três dimensões. Nem Ray Kroc – fundador da McDonalds – escapa à ironia de Knopfler, que lhe dedicou «Boom Like That», equiparando-o a um crocodilo… Em «Don’t Crash the Ambulance», Knopfler imagina vários conselhos que Bush pai terá dado a Bush filho, elaborando uma crítica sarcástica à agressiva política externa da presidência e à intervenção no Iraque:
“We don’t like accidents/Major or minor/You don’t want yourself an incident/don’t ever invade China.” Na voz de Bush pai, afirma: “You can’t move the barriers/You can’t mess with oil and gas/Had to go down there/Stick a couple/Aircraft carriers/In his ass…”
Outro tema, «Secondary Waltz», foi inicialmente gravado nas sessões de Golden Heart, antes de surgir em Kill to Get Crimson, sendo divulgado em discos piratas. Originalmente, possuía um estilo sincopado, reaparecendo com uma sonoridade folk. O tema foca o antigo professor de ginástica de Knopfler, um escocês, ex-militar e rígido, que ensina os alunos a dançar. As crianças “dançam a valsa com medo nos corações”. Knopfler demorou anos a encontrar a música certa. “Não me preocupo demasiado se a melodia não surge. Espero que aconteça, nem que demore 40 anos”. A letra de «Rüdiger», por exemplo, foi escrita aquando do assassínio de John Lennon, mas a canção só seria gravada 16 anos depois.
Em «Iron Hand», a “mão de ferro” remete para “dama de ferro”. O tema é resultado de mais uma reflexão. Ao assistir, na TV, à carga violenta das tropas montadas a manifestantes, durante o governo de Margaret Thatcher, Knopfler lembrou-se da época medieval e concluiu que o Homem não mudou muito.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

THE BEATLES editaram "Love Me Do" há 53 anos

THE BEATLES - ‘LOVE ME DO’

Parlophone, 1962

Foi há 53 anos. A 5 de outubro de 1962 um grupo de quatro rapazes de Liverpool editava um single, nascido depois de três sessões de gravação em estúdios de Londres. Animado pela presença da harmónica tocada por John Lennon, 'Love Me Do’ está longe de ser um dos maiores sucessos da obra dos Beatles, mas transporta aquela carga mítica de ter sido o primeiro. E começaram muito bem, convenhamos…

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

TIM MAIA

Se fosse vivo, Tim Maia celebraria hoje 73 anos. No entanto, entre quem o conheceu, poucos apostariam que chegaria a esta idade, devido aos recorrentes problemas com a obesidade, diabetes e consumo de drogas. Viveu 55 anos, mas deixou bem vincada a sua marca na música brasileira.
O carioca nascido na Tijuca, tinha uma voz rouca, grave, carregada e conquistou o exigente público brasileiro interpretando canções de amor. 
Tim Maia teve a sua época de glória nos anos 70 e 80 do século passado. Músicas como “Primavera (Vai Chover)”, “Não Quero Dinheiro (Só Quero Amar)” , “Gostava Tanto de Você”, “Sossego” tornaram-no num ícone da música brasileira, que várias cantores jovens seguiriam.
Tim tinha sido o introdutor do soul norte-americano, no Brasil, aproveitando a curta experiência que passou na América do Norte, onde ficou maravilhado com a música de Ray Charles, Otis Redding, James Brown. A junção do soul com a música tradicional brasileira criou um estilo musical inovador, à época, o que contribuiu para o sucesso do cantor nascido no Rio de Janeiro. Tim haveria de passar igualmente por uma fase racionalista, onde imperava o funk, mas acabou por se desencantar com a experiência. Entretanto, novos êxitos foram abrilhantando a sua carreira: “O Descobridor dos Sete Mares”, “Do Leme ao Pontal”, “Me Dê Motivo”.  O “motivo” de hoje é recordar Tim Maia. Na década de 1990, diversos problemas assolaram a vida do cantor: problemas com as Organizações Globo e a saúde precária, devido ao uso constante de drogas ilícitas e ao agravamento do seu grau de obesidade. Sem condições para realizar um espectáculo no Teatro Municipal de Niterói, saiu em ambulância, e após duas paragens cardio-respiratórias, faleceu a 15 de Março de 1998. É amplo o seu legado à história da música brasileira, e a sua obra influenciou diversos artistas, entre eles, o sobrinho Ed Motta e o filho Léo Maia (também cantores). A revista Rolling Stone Brasil classificou Tim Maia como o maior cantor brasileiro de todos os tempos.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

NIRVANA... 24 anos de Nevermind e mito para o grunge

Há 24 anos atrás um grito de revolta muda a face da música tal como era conhecida. O niilismo depressivo do anti-herói despojado de artifícios assinalou a ruptura com a era do hair metal, do glam rock, da maquilhagem e lantejoulas, dos ocos excessos. Como diria Mickey Rourke em The Wrestler, referindo-se aos seus ídolos dos anos 80: “os Nirvana chegaram e estragaram isto tudo”.


Estávamos em 1987, na remota cidade de Aberdeen, Washington, quando Cobain conhece Novoselic enquanto ambos assistiam aos ensaios dos Melvins. A demo Fecal Matter, de Cobain, serviu de base para os ensaios do novo projecto com Novoselic mas, com uma sucessão de bateristas até encontrarem Chad Channing, apenas iniciaram as primeiras gravações no ano seguinte. 

Love Buzz, o primeiro single da banda é editado pela editora independente de Seattle Sub-Pop em finais de 1988 e logo os Nirvana iniciaram a gravação do seu primeiro álbum de estúdio. O mítico Bleach surge à luz do dia em 1989 e é um álbum duro, cru, genuíno, a erupção de uma raiva mal contida contra o “establishment”. Nesta época, as principais influências dos Nirvana oscilavam entre o punk dos anos 80, o rock mais duro de bandas como os Mudhoney e Melvins e mesmo o hard rock da década de 60-70, dos Black Sabbath aos Led Zeppelin, banda pela qual Cobain não esconde a sua admiração. A gravação de Bleach custou a módica quantia de 600 dólares e logo após o seu lançamento os Nirvana embarcaram em digressão pelos EUA. 

No início de 1990 os Nirvana iniciaram uma colaboração com o produtor Butch Vig para a gravação de um novo álbum e embarcam novamente em digressão, desta vez com os Sonic Youth. A atribulada saída de Chad deu lugar à entrada de Dave Grohl e o colectivo encontrou, finalmente, alguma estabilidade. As gravações com Butch Vig suscitaram o interesse das grandes editoras e os Nirvana assinam pela DGC Records. 

E eis que surge Nevermind, em 1991, o marco histórico na carreira dos Nirvana que iria revolucionar o panorama musical dos anos 90. Nevermind é um álbum brilhante, com uma grande coerência interna e temas que são um verdadeiro murro no estômago no ouvinte. Smells Like Teen Spirit é, sem sombra de dúvidas, o tema mais emblemático de Nevermind. 

Quem não se recorda da primeira vez que ouviu esta canção? A perplexidade e a angústia deste hino que espelhava tão bem a incerteza e apatia da Geração X. Smells Like Teen Spirit teve desde logo um intenso airplay na MTV e Cobain é elevado ao estatuto do herói de uma geração, tudo aquilo que no fundo abominava. O intenso mediatismo acerca da sua vida pessoal com Courtney Love e da sua dependência de heroína começa a criar uma realidade claustrofóbica para Cobain.

Em finais de 1992 é lançada a colectânea Incesticide, em parte devido à exaustão da banda e aos conflitos que começaram a surgir, mas a indústria musical quer mais. Em 1993 é lançado o último álbum de estúdio dos Nirvana, In Utero. No ano seguinte realizam a sua última tour, passando por Portugal. A grave dependência de Cobain acentua-se e vai tendo algumas overdoses. Os Nirvana antecipam o final da tour de 1994 em Roma e Cobain é pressionado para entrar em reabilitação. Foge da clínica e parte para Seattle, onde é encontrado morto, uma semana depois,

A título póstumo, os Nirvana lançaram ainda no ano de 1994 o MTV Unplugged in New York, em 1996 o From the Muddy Banks of the Wishkah, com gravações de diversos concertos pelos EUA e, em 2009 o Live at Reading, provavelmente um dos melhores concertos do grupo.

O choque causado pelo desaparecimento precoce de Cobain causou a consternação mundial. O herói que não o queria ser não estava preparado para ser a figura central do circo mediático e optou por desaparecer do mundo que o devorou aos poucos. Para a posterioridade fica a imagem da fragilidade de Cobain, o mito, o legado e uma nova era, o grunge.

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Discografia dos ABBA

The Visitors (Polar, 1981) -
The Visitors (Polar, 1981)
Será irónico dizer que a 4 de Abril de 1981 o grupo Bucks Fizz vencia o Festival da Eurovisão, numa roupagem análoga com que os ABBA ganharam em '74, no ano em que estes saíam de cena? Ainda que os britânicos tenham ficado por aí, no mínimo, dá que pensar. Desde o advir do epiléptico período oitentista e toda a panóplia que introduziu a sua acção revolucionária no modo como se faz e se distribui música ( The Visitors é detentor do título de primeiro álbum editado em compact disc) que os ventos de mudança, soprados em Super Trouper , já tinham ancorado no cerne do grupo sueco. Pois é, considere-se este oitavo volume como a maior evasão ao colorido universo ABBA!
Anderson e Lyngstad preferiram seguir os passos do seu (ex-) casal amigo e um mês antes de entrar em estúdio rompem o nó formal que os aliava. Ora, inevitavelmente que o tópico divórcio viria a retomar o seu lugar cativo naquele que, premeditadamente, seria o derradeiro álbum dos ABBA. Mais uma vez, a putrefacção relacional é aguçada ao extremo (provas: ambiente pesado em estúdio e saturação consensual de colaboração profissional). Desta feita, nada mais do que partes bifurcadas e qualitativamente distintas no dissecar do LP em causa: a perda da índole ambiciosa nas letras em contraste com a maturidade colossal das produções e composições musicais.  
Quanto à última fracção, o papel do sintetizador e das novas produções digitais ganharam proporções acima da média: se por um lado " Head Over Heels " e " Under Attack " são martirizados pela excelência desse instrumento coqueluche dos anos 80, " When All Is Said and Done " e " The Day Before You Came " impõem as suas sisudas drum machines com o intuito involuntário de fazer inveja a uns Ultravox e uns Human League. Já no flanco da primeira parte, existe a inegável natureza política (estreia absoluta do colectivo, diga-se de passagem) das letras de " Soldiers " e da fantástica abertura de " The Visitors ".  
Uma outra direcção na análise chega quando algumas faixas trazem a retrospectiva do apogeu ABBA como nos aviva a memória, e tão bem, de " Slipping Through My Fingers " (canção merecedora de uma atenção circunspecta, dado o conturbado lamento de uma mãe que vê a sua filha querida a crescer à medida que o tempo não perdoa em passar) e de " Two for the Price of One " (formidável espírito pop nostálgico a lembrar um "Does Your Mother Know" ou um "What about Livingstone?", com Ulvaeus a fazer-se ao microfone pela última vez). Entretanto, " I Let the Music Speak " e " One of Us " levam para casa a consagração de faixas mais repelentes.  
No ano em que o mundo via nascer um punhado de artistas da nova geração (Britney Spears, Brandon Flowers, Justin Timberlake, Beyoncé, Kele Okereke), o mesmo acenava adeus aos deuses efectivos da pop mundial. Secundado por um trabalho de capa eminente (crédito do já habitual Rune Söderqvist), o clima individualista de The Visitors é mais que notório. Para os fãs injustiçados em relação a Frida, aqui fica um regalo da sua liderança e, para a réstia menos esquisita, eis um banquete da mais incrível pop alguma vez obrada. Ainda que se conceda todo o mérito de um novo fulgor maduro, não é aconselhável afirmar tratar-se de uma obra-prima em termos comparativos ao reportório da banda, mas, então qual a insígnia apropriada ao álbum da melhor despedida da história da música popular?

Alinhamento da edição CD em 1982 (todas as faixas creditadas como Andersson and Ulvaeus):
01 - The Visitors - 5'17"
02 - Head Over Heels - 3'48"
03 - When All Is Said and Done - 3'17"
04 - Soldiers - 4'41"
05 - I Let the Music Speak - 5'23"
06 - One of Us - 3'57"
07 - Two for the Price of One - 3'38"
08 - Slipping Through My Fingers - 3'53"
09 - Like an Angel Passing Through My Room - 3'40"
__________________________________________________
10 - Should I Laugh or Cry? - 4'29" *
11 - The Day Before You Came  - 5'53" (single extraído da compilação The Singles - The First Ten Years , de 1982) *
12 - Cassandra - 4'56" (lado B do single "The Day Before You Came", de 1982) **
13 - Under Attack - 3'48" (single extraído da compilação The Singles - The First Ten Years , de 1982)*
14 - You Owe Me One - 3'26" (lado B do single "Under Attack", de 1982) ***
* - faixas incluídas na reedição de 1997 e na de 2001
** - faixa incluída na reedição de 2001
*** - faixa incluída na reedição de 1997

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Super Trouper (Polar, 1980) -
Super Trouper (Polar, 1980)
Não são só os tempos que correrem que são de marasmo: enquanto Jimmy Carter arrumava as botas, dois dos nomes mais sonantes e ilustres da música desparecem, deixando a mesma obviamente mais pobre. Foram eles John Lennon e Ian Curtis. Piorando ou não as coisas, no panorama discográfico, 1980 testemunha uma emergência do predomínio digital e sintetizado como reacção repulsiva à disco . Ora, parvos é que os ABBA não foram: rejeitam a fórmula de Voulez-Vous e adoptam uma faceta actual e madura no seu penúltimo álbum, não só na sua música (sintetizadores, vocoders , etc.), mas também na sua estética e maneira de estar. Com o intuito de continuar a revitalizar o património popular comum, o colectivo reforça, pela última vez, o seu catálogo de êxitos com Super Trouper .
Corajosamente variegado, este sétimo volume documenta, em jeito implícito, as vicissitudes e venturas no seio da banda enquanto detentora da ribalta. A exteriorização inicia-se logo em " Super Trouper " que, conquanto com uma melodia alegre que nos coage a trautear "su-pa-pah, trou-pa-pah", é tingido por uma tristeza lírica, confinada pelo atributo vocal de Frida e pela excelência da ironia: "Facing twenty thousand of your friends/ How can anyone be so lonely?". Porém, após esta atmosfera optimista e romântica, somos encharcados pelo balde de água fria de " The Winner Takes It All ", incrustado pela podridão emocional patente entre Björn e Agnetha.
A outra tónica presente amiúde é a balada. Ao longo destes anos, duas ou três compreendiam o cerne dos registos da horda sueca; em Super Trouper  ultrapassa as quatro. Já agora, podemos enumerá-las: " Me and I " (passível de uma psicanálise da natureza dupla inerente a todos nós, humanos), " Our Last Summer " (recordação saudável do "tempo onde não havia arrependimentos", compassado pelo estonteante solo de Lasse Wallender), " Happy New Year " (declaração convicta de que tudo se há-de arranjar com mais um ano pela frente) ou ainda " The Way Old Friends Do " (visão positiva de que obstáculos da vida são contornáveis perante a solidez de uma amizade). Motivo? Talvez o clima de corta à faca, a nível conjugal, lá teve a sua influência.
"I wasn't jealous before we met/ Now every woman I see is a potential threat" é o verso inicial, antecedido pelo riff electrónico de Benny, de " Lay All Your Love on Me ", que promete ser uma súplica (de alguém bastante, bastante ciente!) para que um amor doentio se desvaneça. No fim, o fogo-de-artifício mora, sim, no viciante " On and On and On ". É verdade! Já cá faltava o lado onomatopeico ABBA, mas o facto é que eles nos quiseram ensinar uma valiosa lição no que toca a jogos de sedução baratos, numa letra e composição estupendas (pondo de parte o seu refrão funesto e limitado, claro está!). Jamais querendo cingir o resto do LP como paisagem, mas estas são as faixas que o resplandecem.
Faça um favor a si mesmo e derreta-se com mais uns, aproximadamente, três quartos de hora de pura pop. A boa forma persiste ridiculamente paliativa e com o modo confessional accionado. Termo coloquial para holofotes de palco (reflexo da recente relação disfuncional dos casais para com a vida de super estrela, como patenteado na capa),  Super Trouper, para além de se ter tornado numa marca registada da banda ,  trouxe o último n.º 1 em mercados outrora imediatamente garantidos. Talvez um presságio. Mas uma coisa era ponto assente: a transição de bestiais para bestas já ninguém lhes questionava.

Alinhamento original (Todos temas creditados como Andersson, Ulvaeus):
Lado A
1 - Super Trouper - 4'12"
2 - The Winner Takes It All - 4'55"
3 - On and On and On - 3'40"
4 - Andante, Andante - 4'38"
5 - Me and I - 4'54"
Lado B
1 - Happy New Year - 4'24"
2 - Our Last Summer - 4'20"
3 - The Piper  - 3'27"
4 - Lay All Your Love on Me  - 4'34"
5 - The Way Old Friends Do - 2'55"
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11 - Elaine (lado B do single "The Winner Takes It All", em 1988, e integrante na reedição de Super Trouper, em 1997)
12 - Put on Your White Sombrero (faixa bónus da reedição de Super Trouper, em 1997)

bz.stories/36880
Voulez-Vous (Polar, 1979) -
Voulez-Vous (Polar, 1979)
Reza a lenda que, após de terem escalado ao estatuto de semi-deuses da pop, os ABBA ultrapassam a Volvo como maior exportação sueca entre 1978 e o ano posterior - esta é a parte em que se deve conter uma certa perplexidade. Foi necessário um ano (facto inusual, dada a edição anual sucessiva de todos os seus álbuns) para que Voulez-Vous estivesse concluído. Pelo meio, a igualdade no acesso a oportunidades dava outro passo não só com a tomada de posse de Margaret Tatcher, na Inglaterra, e de Maria de Lurdes Pintassilgo, em Portugal, mas também com os cerca de 100.000 participantes na primeira grande marcha pelos direitos da comunidade LGBT na capital dos Estados Unidos.  
Disco , disco , disco ! Esta é a epígrafe frutífera. Num ano em que o mesmo oscilava paradoxalmente entre a continuidade do seu auge (com a manha dos produtores vincada na venda massificada dos seus sucessos) e um movimento antagónico, levado a cabo por fanáticos do rock, que pôs termo ao mesmo, a banda de Estocolmo não se retraiu e pegou naquilo que tinha cunhado em Arrival . O pontapé de saída de " As Good as New " só engana o ouvinte quanto ao género em causa até aos seus 13 segundos. Depois disso, põe uma Donna Summer ou uns Village People a um canto.  
Pas des questions que a faixa-título " Voulez-Vous " é o fio condutor do mote iniciado pelo tema de abertura. Depois, há " Gimme! Gimme! Gimme! (A Man After Midnight) ": desabafo curioso de uma mulher amorosa e carnalmente desesperada, tentando perspectivar-se nos finais felizes das estrelas de cinema que vê na TV. " Summer Night City " é arrepiante no seu sintetizador introdutório; " Angeleyes ", confinado pela sua harmonia intrinsecamente ABBA, acrescenta exíguos arranjos clássicos a uma balada que conta a história de um lobo disfarçado de cordeiro. Tudo isto é belo. Tudo isto é disco .  
A história podia repetir-se com os pouco convidativos " If It Wasn't for the Nights " ou " Lovers Live a Little Longer ", mas travos a um funk negro justifica o facto de uma similitude mais que palpável a Boney M. e Kool & the Gang. Fáceis, redundantes e pronto! Nem mesmo o fastio constante de " The King Has Lost His Crown " (cujo esquema de rimas respigado fecha o cerco ao campo do suportável) consegue mudar a imagem difamada.  
Apesar de não ser um factor dissuasivo, existem algumas evasões ao estilo predominante aqui e acolá, principalmente na hora de acender os isqueiros, de modo a criar o ambiente propício ao delicioso tema de " Chiquitita ". A obra-prima, munida de um instrumental tradicional do grupo, não é mais do que um esplêndido ombro amigo a declarar sem hesitações: "Estou aqui, podes contar comigo.". Já " Does Your Mother Know " pode arranhar um pseudo-rock, mas escutar um Björn, no alto da sua experiência, a proferir palavras como "I can see what you want/ but you seem pretty young to be searchin' for that kind of fun" é algo acutilante. Definitivamente, uma canção imprópria para menores. Por outro lado, o tiro saiu pela culatra em " I Have a Dream ", que somente pontua nos seus coros aprazíveis.  
Bem-vindos ao mundo bifurcado de Voulez-Vous : prazer sim, prazer não. Se por um lado acumula a componente formulaica de êxitos que tanto tem consolidado a banda, por outro revela algumas composições emaciadas e algo estéreis que muitos nem sequer imaginavam possível, vindo de quem vem. Por isso, a pergunta feita em bom francês deixa um ou dois fãs de nariz torcido quando equiparado com o quase imaculado The Album . Religiosamente explorado, assume-se como um convite para reunir o grupo de amigos e organizar uma valente festa para recordar com saudade o disco sound . Calce os tais tacões altos, vista aquelas calças à boca-de-sino e faça o hustle!

Alinhamento original (todas as letras creditadas como Andersson, Ulvaeus):
Lado A
1 - As Good as New - 3'24"
2 - Voulez-Vous - 5'08"
3 - I Have a Dream - 4'43"
4 - Angeleyes - 4'22"
5 - The King Has Lost His Crown - 3'34"
Lado B
1 - Does Your Mother Know - 3'15"
2 - If It Wasn't for the Nights - 5'11"
3 - Chiquitita - 5'27"
4 - Lovers Live a Little Longer   - 3'31"
5 - Kisses of Fire - 3'20"
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11 - Summer Night City  - 3'20" ( single extraído de nenhum álbum e integrante na reedição de Voulez-Vous , em 1997)
12 - Lovelight  - 3'35" (faixa editada originalmente na reedição de Voulez-Vous , em 1997)
13 - Gimme! Gimme! Gimme! (A Man After Midnight) - 4'52" ( single  extraído de nenhum álbum, mas integrante no Greatest Hits Vol. 2 , de 1979, e reeditado em Voulez-Vous, em 1997)

bz.stories/36858
The Album (Polar, 1977) -
The Album (Polar, 1977)
Fosse na Suécia natal, na histérica Austrália ou na grata Grã-Bretanha, já ninguém contestava o círculo de fenómeno que acercava os autores de "Mamma Mia". Este era o momento em que as actuações em playback por palcos televisivos cediam lugar aos concertos magistrais por esse Mundo fora. No ano em que Fältskog deu à luz a Christian Ulvaeus, Saturday Night Fever atulhava as bilheteiras das salas de cinema americanas e, combinado com o falsetto dos Bee Gees, provocava um delírio incontornável. Rumours , dos consagrados Fleetwood Mac, era originalmente editado e começava a trilogia de Berlim de Bowie.
Coincidente com o lançamento do filme ABBA: The Movie , o quinto tomo da banda sueca toma proporções hercúleas não só quando confrontado com o antecessor Arrival , mas também pelas suas duas vertentes ambiciosas: o calcar tímido no território do rock progressivo e o interesse antigo num "mini-musical". Relativamente à primeira parte, quando se julgava um seguimento disco assente em "Dancing Queen", eis a primeira surpresa quando Björn decide copular um solo da sua guitarra arisca à presença constante do sintetizador no hipnótico " Eagle ", na mesma maneira que o guitarrista acólito - Lasse Wallender - deixa um rasto em " Hole in Your Soul ".
No que respeita à composição audaciosa final do disco (o tal "mini-musical"), esta revela-se tripartida: " Thank You for the Music ", " I Wonder (Departure) " e " I'm a Marionette ". É de louvar o engenho depositado por Andersson e Ulvaeus e o roçar de uma Barbra Streisand pelas duas meninas, nesta fábula da "rapariga do cabelo dourado" ( The Girl with the Golden Hair , no seu título original): a saga de um ser ingénuo e dócil, cujo único talento é cantar, que acaba nas garras dos vilões do show-biz . Apesar de encantador, só a primeira peça seria um habitué nos alinhamentos dos concertos.
Podem dar sintoma de estar à margem, mas " The Name of the Game " e " One Man, One Woman - o lado genuinamente meloso que jamais irá desaparecer do universo ABBA - não são menos atractivos que o efeito novidade do registo. Um expõe nitidamente as diferenças vocais entre Agnetha e Frida e o outro, liricamente, talvez tenha o seu toque biográfico, na medida em que alega um desmame nas relações. A abertura a cappella de " Take a Chance on Me " parece ser a única faixa que rema contra a maré. Dotado de um refrão contagiante, o que germinou de um inocente ritmo "tck-a-ch" transformou-se noutro êxito sem precedentes.
Se alguma vez foi dito que a riqueza residia nos álbuns anteriores, então olvide-se! Este é o culminar de uma riqueza ainda mais polida com título apropriado; É um interregno abrupto naquilo a que o grupo nos tem vindo a habituar - canções tolas e batidas de perder o fôlego. Gravado nas imediações do Marcus Music Studio, em Estocolmo, The Album fulgura maturidade e sensibilidade artística acima da média para apenas ser denominado como a banda-sonora do documentário sobre o quarteto. Concluindo: eis o zénite da obra ABBA.

Alinhamento original :
Lado A
1 - Eagle (Andersson, Ulvaeus) - 5'53"
2 - Take a Chance on Me (Andersson, Ulvaeus) - 4'03"
3 - One Man, One Woman (Andersson, Ulvaeus) - 4'37"
4 - The Name of the Game (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 4'53"
Lado B
1 - Move On (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 4'45"
2 - Hole in Your Soul (Andersson, Ulvaeus) - 3'43"
3 - Thank You for the Music (Andersson, Ulvaeus) - 3'51"
4 - I Wonder (Departure) (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 4'34"
5 - I'm a Marionette (Andersson, Ulvaeus) - 4'05"

bz.stories/36751
Arrival (Polar, 1976) -
Arrival (Polar, 1976)
Peculiarmente, 1976 foi um ano de desaires: morre o líder do Partido Comunista Chinês, Mao Tsé-Tung, é identificado, pela primeira vez, o vírus do Ébola e, tanto Bob Marley como o seu produtor, são alvos de uma tentativa fanática de homicídio. Em jeito irónico, só mesmo um rumor disseminado pela imprensa alemã da morte dos ABBA num acidente de avião (com Frida a ter sorte de ter sido a única sobrevivente) podia reflectir maximamente o trono no qual o quarteto estava sentado. Parece que fazer uma paragem estava fora de questão e a Arrival foi confiada a missão de conquistar a terra do Tio Sam. Este é o ponto de viragem na carreira da banda, com direito a um primeiro "B" invertido no logótipo e tudo! 
Chama-se " Dancing Queen " e é culpado pelo glissando mais famigerado da história da música. Piscando o olho à percussão de Dr. John's Gumbo , do artista blues grass Dr. John, e ao êxito "Rock Your Baby" de George McCrae, o clássico derrama litros de disco e uma letra que até foi perfilhada pelo ponto vista mais melodramático da comunidade LGBT. Este é um notável exemplo da faceta profícua de Björn e Benny enquanto exímios alunos da pop americana, preceituada a emergência do género em causa pelos Bee Gees ou Trammps (embora o seu clímax viria um ano ou dois depois). " That' s Me " repete a dose da nova fórmula.  
A fusão incisiva das guitarras rítmicas com o piano melodioso tão característica do grupo é empregue na oposição lírica entre " Knowing Me, Knowing You " (previsão maldita que lida com separação) e " When I Kissed the Teacher " (pequena página de diário de uma paixoneta de liceu). Mas a máquina ABBA mostra-se bastante mais oleada no piano vintage de " Money, Money, Money " (tema marcado pela sua reminiscência ao musical Cabaret devido a sua primeira actuação num programa de TV) ao tentar servir de ode aos caprichosos sonhos de uma mulher sedenta por um magnata ("In my dreams I have a plan/ If I got me a wealthy man"), bem como o tema-título " Arrival ", o segundo e último instrumental ávido de Andersson e Ulvaeus. 
Golpeando outras nuances do LP, abrem-se as frinchas das cordas entristecidas de " Fernando ", que narra a nostalgia de dois veteranos de guerra, e penetra-se no toque mordaz da metáfora de " Tiger " que, para além de surpreender com as cordas vocais desmedidas de Agnetha, deixa o aviso que anda por aí alguém temível. " Dum Dum Diddle " não só aparece com mais uma brincadeira à volta de onomatopeias como encerra um ciclo de meninas amorosamente destroçadas enquanto Benny carrega com força nas teclas do seu sintetizador.  
Em bom rigor, o teor de Arrival é condensado pelo progresso das duas vocalistas e pelo rumo arrojado das composições e letras, ainda que inofensivas, a cada álbum que passa. Mereceu ainda o destaque na nomeação de "Best International Album" na cerimónia inaugural dos BRIT Awards, mas perderam para os Beatles. E depois? O que realmente interessa é o alcance quarto-mundista feito pelos suspeitos do costume, aqueles que há meia década atrás deambulavam pelas lides do folk . Agora, sim, Stig Anderson podia respirar de alívio.

Alinhamento :
Lado A
1 - When I Kissed the Teacher (Andersson, Ulvaeus) - 3'01"
2 - Dancing Queen (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 3'50"
3 - My Love, My Life (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) 3'51"
4 - Dum Dum Diddle (Andersson, Ulvaeus) - 2'53"
5 - Knowing Me, Knowing You (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 4'51"
Lado B
1 - Money, Money, Money (Andersson, Ulvaeus) - 3'06"
2 - That's Me (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 3'15"
3 - Why Did It Have to Be Me? (Andersson, Ulvaeus) - 3'20"
4 - Tiger (Andersson, Ulvaeus) - 2'55"
5 - Arrival (Andersson, Ulvaeus) - 3'00"
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11 - Fernando (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 4'12" ( single integrante do primeiro Greatest Hits da banda, em 1975, e adicionado na reedição de Arrival em 1997).

bz.stories/36667
ABBA (Polar, 1975) -
ABBA (Polar, 1975)
No âmago dos fãs, é conhecido como "The Limo Album" (fruto da capa onde o quarteto se acomoda em opulência numa limusine), mas para que tal merecesse a honra de ter um título homónimo, foram precisos dois registos de originais serem editados. Em simultâneo, a pop vivia num corrupio perceptível pela escalada dos 10cc, pelos primeiros sussurros da disco e por um Stevie Wonder recém-premiado de Grammy's. Até as músicas dos The Who eram transformadas em musical! A competição compunha-se alarmante para os ABBA, mesmo consolidados pelo empurrão da Eurovisão e abastecidos por êxitos consecutivos e um presunçosamente intitulado Greatest Hits.  
Sentia-se o espírito imperativo em dominar os outros mercados discográficos, uma vez que a Europa já se tinha ajoelhado a esta espécie de Beatles em casais. Ainda assim, a fasquia mostrava-se elevada com a invejável rapsódia da trupe de Freddie Mercury. Aliás, uma tentativa de arranjo orquestral à la Queen dos suecos está patente em " Intermezzo No. 1 " - uma experimentação instrumental pseudo-clássica delatora do fascínio de Benny e Björn pelo musical.
Contudo, o cerne nutritivo está mesmo naqueles temas que fizeram o grupo desfilar na passadeira vermelha como é o caso de " SOS " (que denuncia uma Agnetha lavada em lágrimas ao som do sintetizador abrasivo de Benny) e de " So Long " (pura prova do discernimento de Stig Anderson na edição como primeiro single , enroscado de um guitarra mais escabrosa, numa história caricata sobre um rufia da pior espécie, abreviada pelo verso de tripla rima "Tracy, Daisy, they may be crazy"). 
"Bohemian Rhapsody" não se desviava do primeiro posto das tabelas até que a interjeição italiana mais conhecida do Mundo o suplantou. " Mamma Mia ", clássico intemporal provido de alguma pilhéria, é inconfundível nas suas teclas iniciais do Mellotron de Andersson seguido pelos acordes de Ulvaeus. A popularidade do single jamais teria sido viável sem a ferramenta do teledisco promocional no qual um fundo branco homogéneo envolve os perfis dos quatro membros, guarnecidos por roupas da mesmíssima cor. Outro ponto de interesse é, finalmente, o piquinho a glam que há muito se vangloriavam (" Hey, Hey Helen " e " Rock Me "). Indubitavelmente, Gary Glitter esteve aqui. 
Mais uma vez, os ABBA quiseram provar de que dos rótulos não reza a história da pop. E assim o confessaram no tributo ao líder de orquestra Billy Vaughn no arranjo de um saxofone - homenagem aos clássicos schalger dos anos 50 - de " I Do, I Do, I Do, I Do, I Do ", faixa que fomentou a lendária frase " Love me or leave me". E o caso cíclico da balada é inevitável no timbre angélico das duas meninas, em especial de Fälkstog, na enumeração genialmente absurda de elogios de alguém apaixonado ("You thrill me, you delight me/ you please me, you excite me/ you're something I'd been pleading for") em " I've Been Waiting for You ".  
Após um álbum eclecticamente pop, nada como uma dose, em parte do mesmo, mas no geral permeável a uma síntese entre o que já se fez de melhor entre dois géneros diferentes, mas não incompatíveis: a pop e o rock. Novamente, a mestria e eficiência da dupla Andersson-Ulvaeus e o selo de Stig Anderson tornaram obsoletos os grupos que não conseguiam produzir um single por LP. Apesar de terem cometido o risco de inaugurar o álbum com "Mamma Mia", não é difícil ouvir um resto repleto das canções mais refinadas da década de 70. Enfim, quer se goste, quer não, já eram favas contadas para Austrália!

Alinhamento original :
Lado A
1 - Mamma Mia - (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 3'32"
2 - Hey, Hey Helen - (Andersson, Ulvaeus) - 3'17"
3 - Tropical Loveland (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 3'16"
4 - SOS - (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 3'23"
5 - Man in the Middle - (Andersson, Ulvaeus) - 3'03"
6 - Bang-a-Boomerang - (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 3'04"
Lado B
1 - I Do, I Do, I Do, I Do, I Do - (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 3'17"
2 - Rock Me - (Andersson, Ulvaeus) - 3'06"
3 - Intermezzo No. 1 - (Andersson, Ulvaeus) - 3'48"
4 - I've Been Waiting for You - (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 3'41"
5 - So Long  - (Andersson, Ulvaeus) - 3'06"

bz.stories/36418
Waterloo (Polar, 1974) -
Waterloo (Polar, 1974)
Por cá, "E Depois do Adeus" e "Grândola, Vila Morena" eram prescritas como as senhas de arranque para o golpe de estado que proporcionou o 34.º ano da nossa actual democracia. Lá fora, Cher exigia os papéis do divórcio a Bono, após 10 anos de matrimónio, e Patti Smith berrava "Hey Joe" (a versão da música popular americana celebrizada por Hendrix) o qual muitos consideram ser o 1.º single do género punk . Este quadro da música em nada intimidava Stig Anderson no calcetar do caminho para o fenómeno dos Fab Four , discriminando o Melodifestivalen e, por seu turno, o Festival da Eurovisão de '74 como atalhos.
Muito aquém de ser catalogado como um LP excelente, ao descaroçar Waterloo vai-se desvendando uma tendência eclética estrondosa. Ele despeja um hard rock (" Watch Out " e King King Song ") que deixa boquiaberto todo o séquito de gente passível de rotular a banda em causa, constatando o olho clínico da dupla de compositores nos colegas New Your Dolls ou Montrose, como também salpica um reggae das Caraíbas (" Sitting in the Palmtree " e " My Mama Said ") que leva o ouvinte a questionar-se se Catch a Fire ou Burnin' não tiveram a sua mea culpa em tão grande atrevimento.
Até ao nível vocal há um contraste: ao passo que o atributo schalger vocal de Agnetha e Frida  regressa em faixas como " Hasta Mañana " , a pujança viril toma de assalto a estampagem dos californianos Beach Boys de " Dance (While the Music Still Goes On) ". Sustentando a sua natureza heteróclita, o álbum despede-se com " Suzy-Hang-Around " que, conquanto com uma letra pouco desmontável, presenteia um riff de guitarra agradável de se ouvir.  
Todavia, sem margem para dúvidas que o frenético " Waterloo ", ainda que dispense apresentações, é a celebração da vida no seu estado mais puro. Torneado por um rock lavado e um jazz algo insolente, relata a rendição de alguém em virtude de um romance perdido, na mesma e esfarrapada maneira que Napoleão fez na batalha de Waterloo, em 1815 (embora haja aqui uma gralha histórica, já que o imperador francês se rendeu na Batalha de Rochefort, quatro semanas depois). Bendito Stig Anderson e a sua artimanha! A fórmula vencedora é mais uma vez visitada na textura pop de " Honey, Honey ", melodia orelhuda ladeada por passos de dança curtos, mas acertados.
Obviamente que a indumentária glam apregoada na capa (e imortalizada no brilharete da noite de 6 de Abril de 1974) não teve outro propósito senão impressionar o júri da Eurovisão, pois nem um laivo do género é assinalado em Waterloo . Inversamente, o argumento de peso do registo exibe-se pelo seu rol dos mais diversos estilos, recheado de canções devidamente pomposas e alegres - características que, ainda assim, não o safam de uma descompostura justa enquanto álbum de longa duração. Valeu-lhes o passaporte directo para fora do anonimato europeu.    

Alinhamento original :
Lado A
1 - Waterloo (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 2'49"
2 - Sitting in the Palmtree (Andersson, Ulvaeus) - 3'38"
3 - King Kong Song (Andersson, Ulvaeus) - 3'14"
4 - Hasta Mañana (Andersson, Ulvaeus) - 3'11"
5 - My Mama Said (Andersson, Ulvaeus) - 3'14"
6 - Dance (While the Music Still Goes On) (Andersson, Ulvaeus) - 3'13"
Lado B
1 - Honey, Honey (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus) - 2'55"
2 - Watch Out (Andersson, Ulvaeus) - 3'47"
3 - What About Livingstone? (Andersson, Ulvaeus) - 2'57"
4 - Gonna Sing You My Love Song (Andersson, Ulvaeus) - 3'39"
5 - Suzy-Hang-Around (Andersson, Ulvaeus) - 3'11"

bz.stories/36334
Ring Ring (Polar, 1973) -
Ring Ring (Polar, 1973)
Algures no subconsciente dos americanos que viveram a angústia de ter passado os dias a imaginar o regresso do marido, pai ou filho que combatia na Guerra do Vietname, está guardada a simbologia do cessar da mesma em Burst of Joy de '73, do fotógrafo Sal Veder, distinguida pelo prémio Pultizer no ano seguinte. Não menos importante, o mundo da música tecia rasgados elogios a Aladdin Sane do Mr. Ziggy Stardust e a The Dark Side of the Moon dos Pink Floyd. Porém, estas eram influências peregrinas para o quarteto que lidava com uma folk que evocava Simon & Garfunkel e The Carpenters.
Ao menos acérrimos, a sonoridade de Ring Ring não é tão familiar quando se associa o grupo sueco ao estilo disco posterior, mas isso justifica-se porque precisamente ainda não havia uma entidade ABBA e, sim, Björn & Benny, Agnetha & Anni-Frid. Nesse sentido, verifica-se logo a anormal liderança masculina (visto que o resto da discografia há uma predominância vocal feminina) em " People Need Love " e " Love Isn't Easy (But It Sure It's Hard Enough) " - títulos promissores de que é urgente um Mundo norteado pelo amor mas que existem os seus desafios no momento de o obter. " She's My Kind of Girl " não foge novamente à regra e aparece como o tema com o microfone totalmente cedido a Ulaveus e Andersson.  
Ainda assim, o atributo vocal schalger do lado feminino ajustou-se ao historial folk dos dois rapazes nas faixas " Another Train, Another Station " e " Nina, Pretty Ballerina " (descaradamente acusativas de uma Gitte Hænning e Rex Wildo fugidos das baladas elegíacas), que não são mais do que um festejo outonal que nos transporta ou para os parques urbanos suecos ou para as regiões alpinas.
Já a balada bem disposta de " Disillusion ", co-escrita por Agnetha, dá-nos um ponto de vista intransigente de um ser destroçado que deixa bem claro que a compreensão alheia só é válida quando se está na pele do próprio ("They say my wound will heal and only leave a scar/ But then, they never shared our love"). Só mesmo " Ring Ring " (cujo single sofreu reedições umas atrás das outras, dando de si na lojas britânicas apenas em '94) é que começa a dar o gostinho ABBA a que todo o povo se acostumara.
Ring Ring está irrigado pela técnica "wall of sound" (crédito pioneiro de Phil Spector) confinada por Michael B. Tretow, efeito áudio reminiscente das rádios AM e jukeboxes das décadas de 50 e 60 americanas. Ideia por muitos aplaudida, mas por outros criticada (como a insatisfação de Paul McCartney no dedo de Spector na produção de Let It Be , dos Beatles, daí o título da edição remasterada do mesmo - Let It Be... Naked , em 2003). Mas o que verdadeiramente qualifica este produto final é a índole empírica assente na hipótese da aliança vozes-composições funcionar em pleno. E, adivinhem? Não é que foi tiro certeiro! Foi a ideia original do mesmo que despertou no grupo de se apresentar como um projecto sério e realista. Avante!

Alinhamento original :
Lado A
1 - Ring Ring (Andersson, Stig Anderson, Ulvaeus, Neil Sadak, Phil Cody) - 3'06"
2 - Another Train, Another Town (Andersson, Ulvaeus) - 3'13"
3 - Disillusion (Fältskog, Ulvaeus) - 3'07"
4 - People Need Love (Andersson, Ulvaeus) - 2'46"
5 - I Saw It in the Mirror (Andersson, Ulvaeus) - 2'34"
6 - Nina, Pretty Ballerina (Andersson, Ulvaeus) - 2'53"
Lado B
1 - Love Isn't Easy (But It Sure It's Hard Enough) (Andersson, Ulvaeus) - 2'55"
2 - Me and Bobby and Bobby's Brother (Andersson, Ulvaeus) - 2'52"
3 - He Is Your Brother (Andersson, Ulvaeus) - 3'19"
4 - She's My Kind of Girl (Andersson, Ulvaeus) - 2'45"
5 - I Am Just a Girl (Andersson, Ulvaeus) - 3'03"
6 - Rock 'n Roll Band (Andersson, Ulvaeus) - 3'11"