Contexto: Álbum de estreia dos Dire Straits, 1978. Knopfler escreveu esta canção numa guitarra acústica ao estilo de Bob Dylan, depois de ter visto uma banda a tocar num pub. É a história impressionista de um grupo de músicos que toca por divertimento numa sexta-feira à noite, em Londres; inclui personagens como “Harry” e “Guitar George”. Knopfler era, na altura, professor, pelo que esta vinheta lhe chamou a atenção: Não pretendia fazer parte de uma banda deste tipo, mas sim, seguir a carreira musical.
“Estremecemos nas trevas, chove no parque, mas entretanto… a sul do rio paramos e não pensamos em mais nada…” Quando Knopfler compra uma Fender Stratocaster, altera a melodia mas mantém a letra. Adota os acordes de Del Shannon em «Runaway». Desenvolve uma técnica irónica, contrastando o lirismo na guitarra com um estilo vocal “adequado”. Ao ouvir Live at the Regal, de B.B. King, apercebe-se de que a guitarra pode ser um complemento da voz e decide tentar a sua própria versão desta abordagem.
Em 1978, no meio do boom do punk rock, «Sultans» foi uma pedrada no charco, visto que ninguém tocava neste estilo. Mas qual? Com influências dos blues e de JJ Cale, Knopfler criou algo que ainda hoje é referido como “estilo”. Frase comum: “Se pusermos muitas guitarras nesta gravação, parece Dire Straits”, criticou alguém. Pois, mas qual é esse Estilo?
É imediatamente identificável. Knopfler segue as escalas ortodoxas dos acordes, não se deixando limitar nem intimidar por elas. É uma guitarra límpida, com alguma compressão e uma tonalidade líquida. As notas não são subidas meio-tom, mas 1/3. Há um uso sincopado das double e triple stops – conjunção de duas ou três notas em uníssono, para criar uma afirmação – repare-se no riff constante que pontua o tema. Não se pode dizer que é country, rock ou blues, especificamente. É o tal “estilo Dire Straits”, por vezes tão renegado por ser tão despido de artifícios.
Situação real: Um eletricista que nos vem compor o quadro a casa. “Este tipo que tem aí a tocar… dedos de ouro. Conheço-o logo.” Nem sabe o apelido húngaro, e o nome da banda pode não lhe dizer nada. Mas o som é imediatamente cativante. Apela a todas sensibilidades. Ora, isto é algo raro, digno de Gershwin. E podemos identificar facilmente um tema de Chopin, mas o intérprete é mais difícil.
O primeiro solo de «Sultans of Swing» é um intermezzo com uso criativo de arpeggios. O segundo (e famoso) solo está longe da pirotecnia ao estilo de Van Halen. Mas a sobreposição dos acordes às notas resulta na perfeição, embora não seja uma equação complicada. É, ainda assim, matemática, e uma questão de contexto.
No mesmo álbum, «Down to the Waterline» é um tema de execução mais difícil e de maior complexidade, mas não é mais imediatamente identificável do que o solo sincopado de Knopfler com três acordes como pano de fundo, que todos reconhecem em «Sultans of Swing».
O mérito do compositor foi a criação de uma paleta. Havia muito mais a dizer… Neste caso, trata-se apenas de um guitarrista com apelido de pronúncia difícil, uma ideia que se afigura fácil e algo a transmitir. Parte tudo daqui. O génio, isto é.
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